
O relato da estudante de medicina Ayanne, que afirmou ter sido vítima de racismo dentro de um hospital universitário da UFPA, levantou não só o debate sobre discriminação na área da saúde, mas também expôs a força do racismo estrutural. Além da violência em si, outra ferida escancarada veio nos comentários da matéria: muitos leitores desacreditando o relato e questionando se houve mesmo racismo.
Esse tipo de reação é, justamente, uma das marcas do racismo estrutural — aquele que não se resume a xingamentos explícitos, mas que está presente em olhares, suposições, “enganos” e, principalmente, na dificuldade da sociedade de reconhecer o preconceito.
No caso de Ayanne, o colega ignorou o nome bordado no jaleco, o símbolo do curso e o contexto em que ela estava, e a abordou como se fosse funcionária da limpeza, com base apenas na cor da pele e na blusa azul. Mesmo após o erro, não pediu desculpas. Para quem vive o racismo, esse tipo de “engano” é cotidiano e devastador.
Racismo não precisa ser declarado para existir
Muitas pessoas só reconhecem o racismo quando há agressão verbal direta. Mas o racismo estrutural age em camadas mais profundas. Ele está na suposição de que uma mulher negra não é médica, de que não pertence à universidade, ou de que “exagera” ao relatar sua dor.
Essa negação também é parte do problema. É como se a sociedade dissesse: “Você só pode falar de racismo se eu achar que foi grave o suficiente”. E isso impede o acolhimento e o avanço de um debate sério sobre igualdade racial.
Quem pode dizer o que é racismo?
A dor e a percepção de quem sofre devem ser respeitadas. Ayanne compartilhou o que viveu com sinceridade e coragem. Ela não pediu punição pública, não expôs o colega. Apenas relatou algo que a machucou — e esse relato precisa ser ouvido com empatia, não com julgamento.
O debate sobre racismo não deve ser travado entre “quem acredita” e “quem duvida”, mas sim sobre como a sociedade pode evoluir para que todas as pessoas se sintam respeitadas, acolhidas e representadas, especialmente em espaços onde historicamente foram excluídas.
Casos como esse devem servir de alerta: não é o desconforto de quem lê a denúncia que deve pautar a discussão, e sim o desconforto de quem a viveu.
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