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Medicamento brasileiro polilaminina é apresentado em SP e aponta para avanço inédito no tratamento de lesões medulares

Desenvolvido a partir de proteína extraída da placenta, o fármaco —fruto de 25 anos de pesquisa— foi apresentado em 9 de setembro em São Paulo; resultados iniciais em voluntários e animais são promissores, mas Anvisa ainda aguarda dados pré-clínicos complementares antes de autorizar estudos ampliados.

Um medicamento experimental brasileiro chamado polilaminina —obtido a partir da proteína laminina extraída de placenta humana— foi apresentado publicamente em São Paulo em 9 de setembro de 2025. Pesquisadores e representantes do laboratório Cristália afirmam que a substância tem potencial para estimular a regeneração da medula espinhal em pacientes com lesões traumáticas que causaram paraplegia ou tetraplegia, devolvendo movimento e sensação a voluntários que participaram das aplicações iniciais.

Origem da pesquisa e equipe

A polilaminina é o resultado de cerca de 25 anos de estudos liderados pela pesquisadora Tatiana Coelho de Sampaio, professora-doutora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). A pesquisadora e sua equipe de biólogos investigaram a ação reparadora da laminina —proteína conhecida por atuar no sistema nervoso— até chegar ao composto polimérico que hoje é produzido em escala laboratorial. O desenvolvimento técnico foi feito em parceria com o laboratório farmacêutico Cristália.

Como a polilaminina age (mecanismo apresentado)

Segundo os pesquisadores, a polilaminina age sobre neurônios maduros, induzindo um processo de “rejuvenescimento” que permite a formação de novos axônios —os finos “fios” que transportam impulsos elétricos entre o cérebro e o corpo. Essa capacidade de reativar trajetórias neurais inativas é a base da hipótese de que a substância pode restabelecer a condução nervosa interrompida por fraturas, luxações ou esmagamentos da medula. Estudos pré-clínicos mostraram efeitos rápidos em modelos animais; os pesquisadores relatam sinais de resposta já nas primeiras 24 horas em roedores.

Resultados iniciais em voluntários: relatos e limites

Em estudos experimentais controlados —cuja divulgação foi parcial até o momento—, oito voluntários receberam aplicação direta da polilaminina na coluna e apresentaram recuperação total ou parcial dos movimentos, conforme os relatos dos pesquisadores e dos próprios participantes. Dois desses voluntários foram trazidos para a apresentação: a atleta paralímpica de rugby Hawanna Cruz Ribeiro, que ficou tetraplégica após uma queda em 2017, e Bruno Drummond de Freitas, que sofreu um acidente de trânsito. Hawanna relatou ter recuperado entre 60% e 70% do controle do tronco e melhoras na sensibilidade; Bruno afirmou ter recuperado integralmente —aplicado 24 horas após o trauma— e voltou às atividades diárias em cerca de cinco meses. Os casos ilustram respostas variadas e reforçam a importância de avaliar fatores como tempo de aplicação e extensão da lesão.

Estudos em animais e replicação dos resultados

Além dos relatos humanos, os pesquisadores destacam resultados consistentes em cães e roedores: animais com lesões medulares experimentais recuperaram a marcha e apresentaram sinais de reconexão neural após a aplicação. Essas repetições em diferentes laboratórios são citadas como parte do esforço para comprovar reprodutibilidade do método antes da ampliação dos testes em humanos. Ainda assim, especialistas consultados pedem cautela, lembrando que resultados em modelo animal nem sempre se traduzem em eficácia controlada e segura em larga escala para pacientes humanos.

Situação regulatória: Anvisa e próximos passos

O processo regulatório está em curso: a Anvisa informou que, até o momento, os dados submetidos referem-se a etapas iniciais não clínicas e que há necessidade de complementação de informações pré-clínicas antes de autorizar um ensaio clínico ampliado. O Cristália e a equipe esperam que a autorização para estudos clínicos regulatórios seja liberada em prazo relativamente curto —algumas reportagens citam expectativa de cerca de um mês—, mas a agência reforça que análises técnicas e dados adicionais são indispensáveis para avaliar segurança e eficácia antes de qualquer aprovação. Em nota pública, a Anvisa ressaltou que não é possível afirmar segurança e eficácia sem a conclusão da revisão dos dados.

Reações de especialistas e ponderações éticas

Pesquisadores e médicos ouvidos pela imprensa consideram o achado altamente promissor, mas pedem prudência: os resultados publicados ainda são limitados, não há estudos randomizados e controlados amplos divulgados, e a translação para populações maiores precisa de protocolos rigorosos, acompanhamento de efeitos adversos e demonstração consistente de benefício. Além disso, temas como patenteamento, acesso ao tratamento, custo e critérios de elegibilidade (por exemplo: janela temporal após o trauma) serão decisivos para o impacto social do fármaco. O próprio Cristália e a equipe reconhecem que “os resultados não são iguais para todos” e admitem que a rapidez da aplicação tende a influenciar positivamente o prognóstico.

O que vem a seguir

Se a Anvisa autorizar os ensaios clínicos regulatórios ampliados, o próximo passo deve incluir estudos fase 1/2 com mais pacientes, protocolos multicêntricos e monitoramento prolongado para avaliar segurança a médio e longo prazo. Pesquisadores também apontam a necessidade de estudos para lesões crônicas (mais antigas) e para investigar o quanto o resultado depende da reabilitação complementar pós-operatória. O processo de patente e a proteção do ineditismo já teriam sido iniciados, mas tanto a consolidação científica quanto a disponibilidade prática do medicamento podem levar anos.

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