Mesmo com a COP30 se aproximando e Belém se preparando para sediar a conferência em novembro de 2025, o tema das mudanças climáticas tem sido ignorado pelos principais candidatos na eleição para a prefeitura da capital paraense. Com recursos de aproximadamente R$ 4 bilhões previstos para a organização do evento, que tratará de questões ambientais globais, a campanha eleitoral tem dado preferência a problemas locais, como a coleta de lixo e a infraestrutura, em vez de soluções para as questões climáticas.
Distância entre a COP30 e a população
Gilvane Souza, faxineira em um hotel no centro de Belém, representa a realidade de muitos moradores da cidade. Após ouvir repetidas vezes sobre a COP no local onde trabalha, ela pesquisou sobre o evento na internet, mas ainda tem dúvidas sobre seu impacto na vida cotidiana. “Só sei que vão falar sobre a floresta lá”, comenta Gilvane, refletindo a percepção popular de que a conferência, apesar de ser um evento internacional relevante, permanece distante das preocupações diárias da população.
Especialistas como Marco Antônio Lima, professor da Universidade do Estado do Pará (UEPA), concordam que essa distância entre a COP30 e o eleitorado foi um dos fatores que levaram os candidatos a evitarem o tema durante a campanha. “Para muitos, investir em um assunto como a COP não traria retorno eleitoral, já que a maioria da população desconhece seu real impacto”, argumenta Lima.
Prioridades eleitorais e problemas estruturais
Em vez de promover debates sobre o papel de Belém na luta contra as mudanças climáticas, os candidatos preferiram focar em problemas estruturais que afetam diretamente o dia a dia dos eleitores. A coleta de lixo, a falta de saneamento básico e o asfalto das ruas foram alguns dos principais temas discutidos nas campanhas.
Vanusa Santos, coordenadora de pesquisa sobre o meio ambiente na Universidade Federal do Pará (UFPA), lamenta que a oportunidade de discutir soluções climáticas tenha sido deixada de lado. “Não houve uma palavra sequer sobre as contribuições que Belém, como uma cidade amazônica, pode oferecer aos desafios climáticos. Focar apenas na infraestrutura é limitar o potencial da cidade”, comenta.
Polarização política e a COP30
A disputa no segundo turno das eleições será entre Éder Mauro (PL), ex-delegado e parlamentar, e Igor Normando (MDB), deputado estadual apoiado pelo governador Helder Barbalho. Ambos os candidatos representam visões políticas opostas: enquanto Mauro defende a regulamentação do garimpo, Normando tem o apoio discreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e busca uma aproximação com as políticas federais.
A COP30, que deve reunir mais de 50 mil visitantes em Belém, foi mencionada por ambos os candidatos de forma pontual. Normando propôs medidas como o fechamento de trechos da orla aos finais de semana para atividades culturais e a renovação da frota de táxis. Já Mauro focou no turismo, sugerindo a ampliação da capacidade hoteleira da cidade e o uso da repercussão internacional do evento para promover a “marca Belém”.
Desconexão com as mudanças climáticas
Para analistas como Marco Antônio Lima, a falta de propostas robustas sobre mudanças climáticas nas campanhas eleitorais é um reflexo da desconexão dos candidatos com o tema. “Belém não tem um eixo econômico bem definido e vive de dinâmicas econômicas espontâneas. A COP poderia ser uma oportunidade de mudança, mas os candidatos preferiram continuar com o foco na infraestrutura”, explica Lima.
A derrota do atual prefeito, Edmilson Rodrigues (PSOL), no primeiro turno, com apenas 10% dos votos, também foi atribuída à sua tentativa fracassada de vincular sua gestão ao evento climático. Para Ivan Costa, do Observatório Social de Belém, Rodrigues cometeu um erro ao priorizar a COP em sua campanha sem que o evento tivesse conexão direta com as necessidades imediatas da população.
Expectativa de mudança sem foco climático
O novo prefeito de Belém assumirá o cargo em janeiro de 2025, às vésperas da COP30. No entanto, mesmo com a responsabilidade de receber um dos maiores eventos globais sobre mudanças climáticas, as eleições de Belém mostraram que, para muitos eleitores, o asfalto e o saneamento básico ainda são mais importantes do que o futuro climático do planeta.
Para pessoas como Gilvane Souza, que vivem na periferia da cidade, a expectativa é que, independentemente do resultado das eleições, problemas cotidianos, como o esgoto que passa em frente à sua casa, continuem sem solução. “A COP pode ser importante para o mundo, mas aqui, na minha rua, nada vai mudar”, conclui.