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Organizações Indígenas do Pará denunciam falta de consulta em acordo de créditos de carbono

Carta pública assinada por 38 entidades critica decisão do governo estadual de firmar contrato sem ouvir comunidades tradicionais

Na última terça-feira (8), 38 organizações indígenas e comunitárias do Pará divulgaram uma Carta Pública criticando o governo estadual por não consultar os povos tradicionais antes de firmar um contrato com empresas multinacionais para a venda de créditos de carbono. O acordo, anunciado em 24 de setembro durante a Semana do Clima em Nova York, prevê a comercialização de até 12 milhões de toneladas de créditos de carbono como parte de uma iniciativa para reduzir o desmatamento na Amazônia.

A carta denuncia o desrespeito ao direito de Consulta Livre, Prévia e Informada, que assegura a participação das comunidades afetadas por grandes projetos que possam impactar seus territórios. Segundo as lideranças indígenas, o contrato, que envolve empresas como Amazon e Walmart, foi assinado sem o devido diálogo com os povos da floresta, principais guardiões da preservação ambiental na região.

O valor do acordo, estimado em 180 milhões de dólares (cerca de 1 bilhão de reais), foi celebrado pelo governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), como uma importante iniciativa para apoiar a conservação da Amazônia. No entanto, as organizações indígenas alegam que o governo desconsiderou as necessidades e prioridades dos povos que vivem nessas áreas, colocando em risco sua autonomia e direitos territoriais.

“É inaceitável que o governo do Pará tome decisões sem consultar as comunidades tradicionais, que são as maiores protetoras das florestas e, ainda assim, as mais afetadas pela ausência de políticas eficazes de adaptação climática”, afirmaram as entidades na carta.

Críticas à Participação de Empresas Multinacionais
Alessandra Korap Munduruku, professora e líder indígena, criticou duramente a participação de empresas multinacionais no acordo, como a Amazon, destacando que as comunidades indígenas não foram consultadas. Alessandra, vencedora do prêmio ambiental Goldman em 2023 por sua atuação contra empresas de mineração, afirmou que o contrato trata os territórios indígenas como “mercadoria”. “Nossa prioridade é a desintrusão de invasores nas Terras Indígenas Kapayó e Munduruku, ameaçadas por garimpeiros e pela Ferrogrão”, disse.

A carta também ressalta que os povos indígenas não se opõem à preservação ambiental, mas exigem que seus direitos sejam respeitados, incluindo a demarcação de terras e a consulta prévia em projetos que possam afetar suas vidas e seus territórios.

O gabinete do governador Helder Barbalho não respondeu imediatamente aos pedidos de comentário.

LEIA ABAIXO:

CARTA DOS POVOS E COMUNIDADES TRADICIONAIS E PARCEIROS CONTRA O DESRESPEITO AO DIREITO À CONSULTA LIVRE, PRÉVIA E INFORMADA PELO ESTADO DO PARÁ

Em meio a secas históricas e às fumaças que encobrem os céus da Amazônia e do Brasil, o governador do Pará, Helder Barbalho, assinou um acordo de financiamento de créditos de carbono com a Coalizão LEAF, no valor de quase R$ 1 bilhão, supostamente envolvendo a participação de povos indígenas e comunidades tradicionais. A Coalizão LEAF é composta por grandes empresas como Amazon, Bayer e Nestlé, empresas historicamente ligadas a práticas violadoras de direitos humanos e socioambientais, além de governos de países do norte global, como Noruega, Reino Unido, Estados Unidos e Coreia do Sul, que pouco ou nada têm feito para mitigar os efeitos das mudanças climáticas, e tentam terceirizar esta responsabilidade aos povos da floresta. A assinatura do acordo ocorreu durante a Semana do Clima em Nova Iorque, no dia 24 de setembro, e representa uma clara violação do direito dos Povos e Comunidades Tradicionais à Consulta Livre, Prévia, Informada e de Boa-Fé.

A Consulta Livre, Prévia e Informada é um direito internacional que assegura que povos indígenas e comunidades tradicionais sejam consultados de forma autônoma e sem coação antes da implementação de projetos que possam impactá-los. Essa consulta deve incluir a entrega de informações claras e acessíveis, permitindo que as comunidades compreendam as implicações das decisões. Esse processo é essencial para respeitar a autodeterminação e os direitos desses povos, promovendo um diálogo justo com autoridades e empresas. No entanto, o acordo firmado pelo governo do estado do Pará não respeitou esses princípios.

A reivindicação pela demarcação das terras indígenas, a titulação das terras quilombolas e a regularização fundiária são lutas prioritárias na agenda dos defensores e defensoras da floresta. Essas ações são essenciais para garantir a soberania e a continuidade dos modos de vida tradicionais, que desempenham um papel crucial no enfrentamento da crise climática. Esses direitos não devem estar condicionados a qualquer obrigação dos povos, pois são legítimos e inegociáveis. As bandeiras de luta em defesa do meio ambiente, seja físico, cultural ou espiritual, não podem ser tratadas como moedas de troca para a comercialização de créditos de carbono.

Neste momento, em que as consequências das crises climáticas impactam diretamente nossos territórios, é urgente avançar nas lutas concretas em defesa dos Povos e Comunidades Tradicionais, bem como de todos os seres vivos que formam a comunidade que sustenta nossa Mãe Terra. É inaceitável que o Governo do Estado do Pará tome decisões sem consultar as comunidades tradicionais, que são as maiores protetoras das florestas e, ainda assim, as mais afetadas pela ausência de políticas eficazes de adaptação climática.

As respostas para essas crises estão nos territórios. Os povos da floresta precisam ser ouvidos e consultados.

Nossos territórios não estão à venda!

Pará, 8 de outubro de 2024.

Assinam a carta:

1. Aliança Contra Ferrogrão
2. Articulação de Mulheres Brasileiras (AMB)
3. Associação das comunidades de Montanha e Mangabal
4. Associação de Mulheres Indígenas Wakoborũn
5. Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais de Santarém (AMTR)
6. Associação Indígena Da’uk do Alto Tapajós
7. Associação Indígena També do Vale do Acará
8. Associação indígena Pariri
9. Cáritas Brasileira Articulação Noroeste
10. Coletivo de Mulheres Indígenas as Karuana
11. Coletivo Jovens Tapajônicos
12. Coletivo Maparajuba
13. Comissão Pastoral da Terra (CPT)
14. Comitê de Defesa da Vida Amazônica na bacia do Rio Madeira (COMVIDA)
15. Conselho indígena de gestão Ka’apor
16. Conselho Indígena Tapajós-Arapiuns – CITA
17. Conselho Munduruku do Planalto de Santarém
18. Conselho Indigenista Missionário (CIMI/Santarém)
19. FASE-Amazônia
20. Fórum de Mulheres da Amazônia Paraense
21. Fórum da Amazônia Oriental (FAOR);
22. Grupo Mãe Terra
23. Instituto Madeira Vivo (IMV)
24. Instituto Zé Cláudio e Maria
25. Instituto Patauá
26. Instituto Paiakan
27. Movimento de pescadores e pescadoras artesanais do Brasil (MPP)
28. Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA)
29. Movimento Munduruku Ipereg Ayu
30. Movimento Tapajós Vivo (MTV)
31. Organização dos educadores indígenas Munduruku (Arikico)
32. Organização dos Povos Indígenas Apurinã e Jamamadi de Boca do Acre (OPIAJBAM)
33. Sociedade de Defesa dos Direitos Humanos – SDDH
34. Tapajós de Fato (TDF)
35. Terra de Direitos
36. Associação Nova Vitória-Comunidade Jane Júlia- Município de Pau D’arco/PA
37. Associação dos Produtores e Produtoras Rurais Organizados do PA Escalada do Norte – Município de Rio Maria/PA
38. Associação de Moradores Agricultores Remanescente Quilombola do Alto Acará (AMARQUALTA)

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