Por Gustavo Maultasch de Oliveira
Todas as carteiradas são iguais, mas algumas são mais iguais que as outras.
Sou jornalista formado melhor do que você. Então não critique, não questione, não venha com as fake news dos seus blogueiros, apenas acredite e engula a minha reportagem isenta.
Sou biólogo formado melhor do que você. Então fique quieto, acredite, silencie-se, obedeça e sinta o que eu disser; e agora eu estou dizendo: tenha medo e fique em casa (afora para manifestações a favor da democracia; essas não transmitem, acredite).
Sou economista formado melhor do que você. Então cale a boca, ignore as limitações dos meus estudos e aceite a minha visão de mundo, que você, para começar, nem entende o método estatístico descoladão que usei aqui.
Criticou o jornalista? Criticou o biólogo? Criticou o economista?
Você é pré-iluminista, obscurantista, negacionista, anti-ciência, anti-imprensa, subdesenvolvido, atrasado, repulsivo, fascista, racista, praticante de discurso de ódio etc.
Mas e o engenheiro civil? Ele não pode alegar que é engenheiro civil?
Aí a história ficou bonita; de repente baixou a virtude, e todo mundo lembrou que, num país como o Brasil (em que estudar não é, infelizmente, para quem quer, mas sim para quem pode), é feio arrogarem-se títulos para sobrepor a sua opinião à dos outros.
De repente lembramos que é de mau tom menosprezar alguém por falta de títulos; que qualquer pessoa, não importa o estudo que teve, o seu grau de leitura, a sua opinião política ou (pasmem!) não importando nem mesmo em quem ela votou, enfim, lembramos que qualquer pessoa merece o respeito de ter a sua ideia confrontada por outra ideia, e não por carteiradas.
Será que agora os jornalistas, biólogos, cientistas e economistas conseguirão enxergar-se ao espelho?
Podem-me chamar de realista e de cínico, mas já até sei o que esse pessoal pensa: o que vale não é a ética da argumentação e da carteirada, mas sim de que lado da narrativa ela está. A carteirada do jornalista, do biólogo, do economista estão a favor da narrativa, então servem; carteirada do Bem não é carteirada, é resistência. Quem é você, e qual título você tem, para questionar isso?
