A presença de participantes da região Norte no BBB24, com dois representantes do Pará e uma participante amazonense, tem suscitado debates intensos nas redes sociais acerca de questões ligadas à identidade cultural e à representação nacional. Essa discussão ganha relevância, sobretudo, entre os dois estados mais importantes da região: Pará e Amazonas.
Sem dúvida, o Pará desfruta de uma visibilidade midiática superior em comparação com outros estados da região, o que direciona a atenção para as questões locais, as quais, por vezes, também ecoam para outras localidades do Norte. Além disso, o Pará é berço de personalidades de destaque em âmbito nacional, que desempenham um papel fundamental na disseminação das manifestações culturais locais para todo o Brasil.
Um exemplo ilustrativo é a canção “Voando pro Pará”, de Joelma, que não apenas menciona pontos turísticos de Belém, mas também aborda aspectos culturais que extrapolam as fronteiras do Pará. O tacacá, uma iguaria gastronômica citada na música, é facilmente encontrado em outros estados da região Norte. Entretanto, quando os paraenses o identificam exclusivamente como um “prato paraense”, isso pode gerar uma certa invalidação dos demais estados nortistas.
Diante das polêmicas envolvendo Alane e Isabelle no BBB24, expressas principalmente no antigo Twitter ( hoje X), houve acusações por parte dos amazonenses contra os paraenses, rotulando-os como os “paulistas do Norte”. Essa acusação sugere que o estado do Pará é considerado o único verdadeiro guardião da cultura nortista, uma vez que os outros estados não desfrutam da mesma visibilidade nacional. Essa dinâmica remete a uma situação anterior, quando uma amapaense publicou um vídeo acusando os paraenses de “apropriação da cultura nortista”, desencadeando intensos debates nas redes sociais.
A participação da paraense Alane provocou mais debates quando ela comentou que a amazonense Isabelle estava buscando destaque ao dançar durante uma festa na qual tocou uma música de Joelma. Posteriormente, Alane se retratou, afirmou que não pretendia alimentar rivalidades, especialmente com outra mulher, e muito menos de uma mesma região do Norte.
O debate nas redes sociais sobre esse assunto já estava em curso, embora tenha havido excessos, incluindo manifestações de xenofobia. Houve também uma reflexão por parte de alguns paraenses, criticando Alane e até mesmo Belém, por assumirem supostamente o papel de representantes exclusivos da cultura do Norte.
É uma discussão válida, e os próprios amazonenses estão aproveitando a participação de Isabelle, Cunhã do Boi Garantido, para promover o Festival dos Bois de Parintins. Apesar de sua magnitude, esse evento não recebe a mesma visibilidade que, por exemplo, o desfile das escolas de samba do Rio de Janeiro. Isso destaca a importância de reconhecer e valorizar as diversas manifestações culturais presentes em diferentes regiões do Brasil, mesmo aquelas que podem não ter a mesma projeção midiática nacional.
No entanto, é importante considerar que cada indivíduo tem uma perspectiva moldada por suas próprias experiências de vida, e dentro da região Norte, há uma diversidade de realidades. Cada pessoa compartilha sua visão sobre o mundo que conhece. Alane traz consigo as vivências de uma jovem de classe média de Belém, enquanto Isabelle está diretamente envolvida com o Festival de Parintins, representando vivências distintas de duas mulheres nortistas.
Os habitantes de Manaus vão compartilhar aspectos relacionados ao seu mundo em Manaus, assim como os belenenses, macapaenses ou santarenos. A diferença reside no fato de que Belém possui uma visibilidade midiática maior, tornando-se um dos polos culturais do Brasil. Portanto, o belenense vai expressar seu universo cultural específico de Belém, embora seja importante reconhecer que determinados aspectos culturais não são exclusivos da cidade e se estendem por outros estados, como o exemplo do tacacá mencionado anteriormente.
Além disso, é importante destacar que dentro do próprio Pará existe uma diversidade cultural, econômica e de sotaques. Um paraense que nasceu e cresceu no Sul do Pará, por exemplo, pode não ter o hábito de consumir açaí com farinha e peixe frito, tampouco falar com o sotaque característico e usar o termo “égua”. Mesmo dentro do Pará mais tradicional, ao longo do curso do rio Amazonas, observam-se diferenças culturais significativas. De Bragança a Juruti, há distintas camadas que transformam o estado em um verdadeiro caleidoscópio cultural.
No final, é crucial celebrar as diferenças, reconhecê-las, mas também assumir que paraenses e amazonenses têm muito mais em comum do que imaginam. O Pará não se apropria da cultura do Norte, pois ele próprio faz parte do Norte. É essencial que os paraenses reconheçam que nem tudo pertence exclusivamente a eles. O diálogo e a compreensão mútua são fundamentais para fortalecer os laços entre os estados da região e promover uma apreciação mais ampla e inclusiva da rica diversidade cultural que caracteriza o Norte do Brasil.