
Muito além de sua importância econômica, o cacau produzido no Pará tem se firmado como uma experiência turística, cultural e sensorial no coração da Amazônia. Com mais de 53% da produção nacional do fruto, o estado desponta como um dos principais polos de cultivo e transformação do cacau no Brasil. A produção, antes limitada às lavouras, passou a atrair visitantes interessados em conhecer de perto o ciclo do fruto, desde o plantio até a degustação do chocolate artesanal. Fazendas familiares, fábricas e restaurantes têm promovido uma verdadeira imersão nos sabores e saberes da floresta.
Em Castanhal, na região metropolitana de Belém, o Sítio D. Manoel é um dos exemplos de como o cacau pode transformar vidas. O casal Manoel Gomes da Silva e Lia Fernandes apostou no cultivo do fruto após crises na produção de mamão e maracujá. Com uma colheita anual de 15 toneladas, o sítio se tornou referência na região e agora recebe turistas para compartilhar o conhecimento adquirido em oito anos de dedicação. “O cacau salvou minha família. Foi a virada de chave”, destaca Lia.
Outra parada obrigatória é a Fábrica Da Cruz Chocolates, em Ananindeua. O espaço oferece um tour sensorial completo: café da manhã com iguarias feitas de cacau, visita a uma pequena plantação e demonstrações das etapas de produção — fermentação, secagem, torrefação e transformação do fruto em chocolate. O proprietário, o engenheiro-agrônomo Flavio Cruz, conduz pessoalmente os visitantes, reforçando a proposta educativa e afetiva do local. “Transformamos o amor ao cacau em um negócio de família”, diz ele.
A versatilidade do fruto também conquistou o chef paraense Léo Modesto, que ganhou notoriedade após participar do reality “Mestre do Sabor”. Em suas oficinas, ele apresenta uma pasta de cacau com castanha e macaxeira que não endurece na refrigeração, resultado de anos de pesquisa. “Quis provar que era possível criar algo inovador com ingredientes da Amazônia”, conta Léo, que defende uma culinária baseada na biodiversidade regional.
A Ilha do Combu, em Belém, também entrou na rota do chocolate amazônico. A produtora rural Izete Costa, a Dona Nena, é a mente criativa por trás da marca Filha do Combu, que ganhou fama nacional após receber a visita dos presidentes Lula e Emmanuel Macron. O local atrai turistas de todo o mundo, especialmente interessados no tradicional brigadeiro feito com cacau local. “É legal ver que minha história inspira outras mulheres a empreender”, diz Izete, cujo negócio cresce entre 10% e 20% ao ano.
O crescimento da cadeia do cacau no estado também impulsiona eventos de valorização do fruto. O Chocolat Festival, realizado recentemente em Belém, é uma dessas iniciativas. Com passagem marcada por Portugal, o evento destaca o cacau como protagonista, promovendo debates sobre sustentabilidade, produção artesanal e consumo consciente. “Queremos discutir a beleza e a importância do cacau como paixão mundial”, explica Marco Lessa, idealizador do festival.
Além do chocolate, os turistas que chegam ao Pará se encantam com a rica gastronomia regional. Pratos como o tacacá, o pato no tucupi e o tradicional açaí continuam a atrair visitantes. Um dos destaques é o restaurante Saldosa Maloca, também na Ilha do Combu, que está prestes a receber o selo de primeiro restaurante “lixo zero” do Pará. O local proporciona uma vivência completa com os sabores da Amazônia, oferecendo pratos como o tambaqui e promovendo a conscientização ambiental.
A junção entre o potencial agrícola do cacau, a criatividade de produtores e chefs, e o interesse crescente por experiências autênticas fazem do Pará um novo e promissor destino do turismo sensorial e gastronômico. O chocolate produzido na terra do açaí não é apenas saboroso: é símbolo de identidade, resistência e inovação amazônica.